As caras dos políticos explicam nosso destino

As caras dos políticos explicam nosso destino
Podemos ler a história do Brasil na cara dos políticos. Meu Deus, como são feios nossos políticos, como são inatuais, de mau gosto, seus rostos e caretas mostram como será difícil modernizar esta terra. Darwin tem um livro chamado "A expressão das emoções no homem e nos animais". Ali estão catalogadas as expressões fisionômicas dos chimpanzés, dos cachorros e dos homens. São baseadas no "princípio de antítese", nome que Darwin criou, explicando, por exemplo, que um cachorro expressa amor ao dono por uma mutação corporal, facial e rabeal absolutamente negadora de qualquer agressividade, amolecendo as costas, abanando o rabo, babando-o na mão, etc. Mas Darwin não previu a cara dos políticos brasileiros.
O "princípio de antítese" dos nossos políticos, ao contrário, visa a esconder o que sentem, pela negação de seus reais motivos. Assim, o canalha ostenta bondade, o ladrão apregoa honradez, o assassino, delicadeza.
Era assim, mas até isso está mudando. Assistindo ao show de horrores da política recente, concluo que não só se perdeu a idéia de vergonha na cara, como ela foi substituída por um certo orgulho, um certo enlevo em ostentar a própria sordidez como um galardão. Antigamente, o canalha se escondia pelos cantos, roído de vergonha; hoje, ele apregoa, com uma tabuleta na testa: "Roubei, sim. E daí?!" A alma do negócio era o segredo. Hoje, espanta-nos a visibilidade dos estelionatos, conjugada à sublime ejaculação das mentiras.
Penso, claro, na fascinante fisionomia de Barbalho, que é um verdadeiro mapa da politicada do Pará, esse Barbalho sublime que nos seduz com suas sobrancelhas a la diable, com sua boquinha devoradora de tartarugas, cheques e TDA's, com sua resistência impávida diante das provas cabais de suas malfeitorias. Barbalho impressiona pela limpidez de seu cinismo, pela cara lavada, intocada pela dúvida e pelo sentimento de culpa. Olhando bem, veremos que suas bochechas são até banhadas por um tênue, mas impudente sorriso. É fascinante a confiança que esta gente tem na leniência da Justiça. Como eles navegam bem nos foros e nos arquivos, fazendo sumir processo como no caso do Banpará! É maravilhoso vê-los em "retidão", "pátria", enquanto as rãs coaxam no campo de concentração da mulher de Barbalho.
Sim, eu já fui fascinado pelo queixinho de Maluf, erguido a la Mussolini, capaz de falar em "honra" com a evidência de desvios nas obras superfaturadas, já fui hipnotizado pela tranqüilidade carismática de Quércia, cantando Carinhoso num programa de TV, enquanto ele quebrava o Banespa, aplaudido pela sua gang de sociólogos "progressistas", já sofri, no passado, com as carrancas da ditadura, quando surgiu o anão verde-oliva Castelo Branco, menor que o próprio quepe, depois com a car de bulldog de Costa e Silva, iluminado pelo sorriso deslumbrado de Yolanda, a Lady MacBeth brega que mandou baixar o AI-5, depois com a cara de Drácula de Garrastazu Médici, silencioso vampiro, sofri também com a visão das coxas e da barriga de Figueiredo, fazendo ginástica de sunguinha para a nação ver, num strip-tease populista. Depois, lembro-me com pavor do surgimento do único bonito (por fora), o Collor, eleito num clima "gay" que se apossou dos eleitores ("Ele é macho!" - diziam - "ele é lindo, comeu fulana, luta caratê..."), mas agora estou maravilhado diante do Gilberto Mestrinho. Chego a pensar que o Senado está nos sacaneando, acho que Renan Calheiros quis fazer um gesto revolucionário, nos horrorizando para conscientizar a nação da própria desgraça. Porque o Mestrinho no Conselho de Ética do Senado, arrastando um rabo sujo de processos e evidência de assaltos a cofres, com o sambódromo de Manaus superfaturado e desabando, me traz um sentimento de pesadelo cômico. Na cara de Mestrinho mora o impasse nacional. Mestrinho declarou em entrevista que nunca distribuiu uma moto-serra, que nunca desmatou, nunca matou jacaré, chegando ao inefável de dizer que não pinta o cabelo, ali na fotografia, com sua franjinha asa de graúna. Sua carinha maquilada, seu bigodinho lustroso, seus olhinhos vorazes lembram-me Akim Tamiroff em "A marca da maldade". Já vivíamos com a conformada aceitação da nossa desgraça, mas Mestrinho é a apoteose de nosso horror.
Outros políticos, com seu visual didático, já nos ensinaram muito sobre nosso destino. ACM, por exemplo, tem um rosto até bonito, com seu bigodinho branco e um passado de sensualidade. Seu corpo é que conta a história: lento, pesado, marchando como um orichá entre baianas e puxa-sacos, com um vago rebolado de poder que é (ou era) o símbolo puro do coronelismo secular.
Itamar Franco tem o carisma da vítima, um eco mineiro de Jânio Quadros, o caspento, o vesgo, o despenteado no poder. O povão excluído, humilhado, pode vir a se impressionar com seu rostinho de injustiçado, sua bobeira, sua caipirice populista. Itamar encarna a nostalgia de um povo pela própria ignorância, Itamar pode vir a ser a vingança contra os "intelectuais pernósticos" como FH, na mesma raia onde corre o rosto gordinho e infantil de Garotinho, que mal aparece no palácio para despachar e viaja aplaudido por milhões de pirados evangélicos. Santo Deus... é uma fartura de tipos: os olhos verdes de Requião, o charme epileptóide de Pedro Simon, a gordura truculenta de Eurico Miranda, a fria elegância yuppie de Luís Estevão, a alma gordurosa de Newtão, o teatro de Lalau, amparado por policiais, indo para casa comer pizza, todos, sem falar no inesquecível rosto pétreo de José Osmar Borges, o sócio de Barbalho, que, preso, algemado, no camburão, exalava tranqüilidade total, ignorando as câmeras, olhando para o lado, como se dissesse: "Vocês, a imprensa, vocês não existem..." E foi solto, como o grande Naya. Talvez não existamos mesmo...
Sinto que, ao apagar das luzes do governo FH - que, apesar dos pesares, trouxe-nos um charme francês, com sorrisos sociológicos e uma aristocrática tolerância com nossa breguice - estamos voltando para trás. Assanha-se o velho museu de cera da escrotidão nacional. Mestrinho e Jader são os vanguardeiros desta grande marcha à ré.

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